sexta-feira, 19 de maio de 2017

Felicidade, benefício e boa sorte

Terceira Civilização, Edição 471, 01/11/2007, pág. 6 / Especial

“Sofra o que tiver de sofrer. Desfrute o que existe para ser desfrutado. Considere tanto o sofrimento como a alegria como fatos da vida e continue recitando o Nam-myoho-rengue-kyo, não importando o que aconteça. Que outro significado isso poderia ter senão a ilimitada alegria da Lei? Fortaleça sua fé mais do que nunca.”

(“A felicidade neste mundo”. The Writings of Nichiren Daishonin, v. 1, p. 682.)

Por que as pessoas praticam uma religião ou seguem uma filosofia de vida? A resposta mais comum é: para serem felizes.

Embora atingir metas como bem-estar familiar, boa saúde, ascensão social e econômica estejam presentes em muitas sociedades como requisitos para a conquista da felicidade, está claro que essa condição resulta de uma série de valores e experiências pessoais e, portanto, possui caráter particular e subjetivo.

O objetivo desta matéria não é cercear os valores individuais em torno do conceito de felicidade, mas discorrer sobre a forma como o budismo trata esse tema, bem como sobre a questão dos benefícios e da boa sorte, ao qual está estreitamente relacionado.

Felicidade e liberdade

Quando o ser humano tem seus desejos realizados, sente-se feliz. Entretanto, essa felicidade é passageira, uma vez que, na realidade, as pessoas nunca se sentem plenamente satisfeitas, ou seja, estão sempre almejando algo mais.

Felicidade não é sinônimo de ausência de infortúnios. Está relacionada à maneira como cada um encara as adversidades e à capacidade de transformá-las a seu favor. Dessa forma, é algo que depende de si próprio e não de forças externas.

Como todas as religiões, o budismo ensina às pessoas como conquistar uma vida feliz. Entretanto, a maioria das religiões incentiva os seguidores a orar para que uma força transcendental surja e remova os sofrimentos da vida. Nesse ponto, verifica-se que as pessoas, religiosas ou não, procuram livrar-se das causas das dificuldades e da infelicidade. O Budismo de Nitiren Daishonin, por sua vez, ensina que a própria pessoa tem o potencial necessário para transformar as dificuldades em felicidade.

No budismo, a idéia de felicidade equivale a atingir o estado de Buda — o benefício máximo de sua prática. Definir o estado de Buda é extremamente difícil. Quanto mais as pessoas praticam os ensinos de Nitiren Daishonin, mais nitidamente sentem a total inadequação das palavras para expressar o que ocorre em seu coração quando se sentam diante do Gohonzon e recitam o Nam-myoho-rengue-kyo.

Estudiosos budistas criaram, ao longo dos séculos, termos e conceitos na tentativa de responder a pergunta: o que é o estado de Buda ou a condição de felicidade absoluta? O segundo presidente da Soka Gakkai, Jossei Toda, descreveu essa condição de vida às pessoas que passavam por extremas dificuldades do Japão pós-guerra, na década de 1950, com base numa experiência própria: “É como estar deitado em um vasto campo aberto a contemplar o céu com os braços e as pernas estendidas. Tudo o que se deseja aparece num instante. Por mais que vocês gastem, há sempre mais à sua disposição. Tente e verão que vocês podem atingir essa condição de vida”. O fato mais impressionante dessa declaração de Toda é que ele havia chegado a essa compreensão ao passar pela experiência de ter atingido a iluminação dentro de uma minúscula cela carcerária. “A felicidade, a verdadeira liberdade”, dizia Toda, “independe das circunstâncias”.

O Buda Nitiren Daishonin, após ter enfrentado várias perseguições e grandes dificuldades, afirmou: “Não há felicidade mais verdadeira para os seres humanos que recitar o Nam-myoho-rengue-kyo”.1 Dessas experiências, conclui-se que o estado de Buda é um potencial que todos possuem inerente e que pode ser desenvolvido e manifestado.

Como manifestar o estado de Buda?

Em uma de suas explanações do escrito de Nitiren Daishonin “Sobre atingir o estado de Buda nesta existência”, o presidente da Soka Gakkai Internacional, Daisaku Ikeda, comenta: “Myoho-rengue-kyo é o nome da verdade mística suprema, e Nam-myoho-rengue-kyo é o nome do estado de vida dos budas que incorporam essa verdade. Assim sendo, quando recitamos Nam-myoho-rengue-kyo com espírito de procura pela fé, o infinito benefício da Lei Mística manifesta-se em nossa vida. Eis o significado de fazer surgir ou manifestar o estado de vida do Buda.

“Isso corresponde ao princípio de ‘causa e efeito num único momento da vida’ ou ‘simultaneidade de causa efeito’, segundo o qual a fé é a causa, e a manifestação do estado de Buda, o efeito. Quando perseveramos na prática do Nam-myoho-rengue-kyo, tanto nos momentos de sofrimento como nos de alegria, quando nos dedicamos pela felicidade pessoal e dos demais, podemos fazer com que a causa e o efeito de atingir o estado de Buda — dois aspectos que estão compreendidos na prática da recitação do Daimoku — tornem-se o núcleo ou a essência de nossa vida”.2

Essa perspectiva do significado de iluminação transmite infinita esperança por revelar que todos, sem exceção, podem experimentá-la.

O poder para superar os quatro sofrimentos universais

O budismo ensina que há quatro sofrimentos (shoji, em japonês) dos quais ninguém está livre: nascimento, velhice, doença e morte. Dos quatro sofrimentos universais, o nascimento e a morte são os principais. Esse conceito representa a transitoriedade, a mudança e, de fato, toda a experiência das pessoas no mundo secular.

Tudo no Universo está em fluxo constante. A própria imagem que uma pessoa vê diante do espelho não é a mesma que viu no dia anterior.

O budismo defende que as pessoas sofrem por buscarem sua identidade em coisas que são, por definição, transitórias. Os quatro sofrimentos, aos olhos dos mortais comuns, representam, portanto, o oposto ou obstáculos para a sua felicidade. No entanto, aos olhos de uma pessoa iluminada, fazem parte natural da vida e podem ser transformados nas chamadas “quatro virtudes”: eternidade, felicidade, verdadeira identidade e pureza.

Em síntese, eternidade é uma condição em que, não importando a extensão do carma, a pessoa consegue evidenciar a energia vital interior por meio da recitação do Daimoku e revolucionar não apenas a existência presente, mas as futuras também.

Felicidade é a condição de vida em que nada é capaz de abalar o indivíduo, pois, mesmo as piores adversidades, são recebidas com serenidade.

Verdadeira identidade significa estabelecer um “eu” indestrutível, do qual emana a alegria de viver livre e espontaneamente. É uma condição de liberdade ilimitada que exerce total domínio sobre o corpo e a mente, mediante o poder do estado de Buda.

Por fim, pureza denota um estado de vida tão límpido quanto a flor de lótus, que nasce, cresce e desabrocha em águas lamacentas sem se deixar macular. Por meio da recitação do Nam-myoho-rengue-kyo, as pessoas podem manifestar essa pureza e exercerem a benevolência máxima em relação aos sofrimentos das demais, a perseverarem em meio à sociedade turbulenta, sem se deixarem influenciar ou se abater.

Nenhum comentário:

Postar um comentário